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Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei (Turma) Nº 5000705-81.2022.4.04.7213/SC
RELATOR: Juiz Federal JOÃO CARLOS CABRELON DE OLIVEIRA
RELATÓRIO
Trata-se de pedido de uniformização nacional interposto pela parte autora em face de acórdão proferido pela 1ª Turma Recursal de Santa Catarina que deu provimento ao recurso inominado da parte ré, para afastar a concessão de aposentadoria por idade rural.
Alega que o acórdão recorrido diverge de julgado da Turma Nacional de Uniformização.
Sustenta que:
No presente caso foi reconhecido o período de atividade rural em regime de economia familiar entre 31/01/1981 a 24/11/2000 e 01/08/2010 a 19/03/2021. Porém, não foi concedido a aposentadoria por idade rural pelo alegado vácuo de atividade rural no longo intervalo de 25/11/2000 a 31/07/2010 que supostamente caracterizaria os períodos a ele anteriores como remotos, obstando a utilização para fins de aposentadoria por idade rural.
Todavia, a tese firmada pela TNU no Tema 301 é justamente ao contrário. Expressamente decidiu-se que: “Não há coerência em utilizar os parâmetros do período de graça na definição de um ‘tempo rural remoto’, provocado por uma ‘interrupção’ da atividade, capaz de gerar a ‘perda da vocação’ rural. Todos esses critérios são inexistentes na lei e decorrem de uma confusão entre imediatidade e continuidade. Quando autoriza a contagem descontínua do tempo de trabalho rural, a lei garante ao segurado o aproveitamento de todo o tempo trabalhado no campo, mesmo que em momentos diferentes de sua vida laborativa. Isso significa que a descontinuidade não se converte em uma ‘interrupção’ que obsta a contagem do tempo mais antigo: a lei não prevê qualquer exclusão de tempo ‘remoto’.”
Portanto, ao contrário do que afirma o acórdão recorrido, a orientação data pela Turma Nacional de Uniformização através do Tema 301 é justamente no sentido de que a lei garante ao segurado o aproveitamento de todo o tempo trabalhado na agricultura, mesmo que em momentos diferentes de sua vida laborativa, não se admitindo o afastamento da contagem de “tempo rural remoto” [sem a formatação original].
Sem contrarrazões.
O incidente nacional foi admitido na origem e pela Presidência da TNU, sendo distribuído à minha relatoria.
É o breve relatório.
VOTO
A controvérsia aqui colocada diz respeito ao cômputo de tempo rural descontínuo para concessão de aposentadoria por idade rural.
O acórdão recorrido enfrentou a questão da seguinte forma:
Para a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, é necessária a comprovação de exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício (ou ao implemento da idade), igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido, nos termos do art. 39, I, da Lei 8.213/91, sendo inadmissível o cômputo de atividade rural remota para esse fim.
Nesse sentido é o teor do enunciado da súmula 54 da TNU:
Para a concessão de aposentadoria por idade de trabalhador rural, o tempo de exercício de atividade equivalente à carência deve ser aferido no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou à data do implemento da idade mínima.
No caso concreto, o vácuo de atividade rural no longo intervalo de 25/11/2000 a 31/07/2010 caracteriza os períodos a ele anteriores como remotos, obstando a utilização para fins de aposentadoria por idade rural.
E, não obstante a sinalização dada pela Turma Nacional de Uniformização no inteiro teor do acórdão relativo ao Tema 301 do sistema de representativos de controvérsia, não consta da tese firmada orientação em sentido contrário a esse. De fato, consta da tese firmada no Tema 301 da TNU:
[...]
É caso, portanto, de reformar parcialmente a sentença, para afastar a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
O paradigma invocado no pedido de uniformização consiste no Tema 301 dos recursos representativos de controvérsia, sendo dispensada a apresentação de cópia ou link, nos termos do item 3 da Questão de Ordem 3 da TNU.
Cito a tese firmada pela TNU:
Cômputo do Tempo de Trabalho Rural I. Para a aposentadoria por idade do trabalhador rural não será considerada a perda da qualidade de segurado nos intervalos entre as atividades rurícolas. Descaracterização da condição de segurado especial II. A condição de segurado especial é descaracterizada a partir do 1º dia do mês seguinte ao da extrapolação dos 120 dias de atividade remunerada no ano civil (Lei 8.213/91, art. 11, § 9º, III); III. Cessada a atividade remunerada referida no item II e comprovado o retorno ao trabalho de segurado especial, na forma do art. 55, parag. 3o, da Lei 8.213/91, o trabalhador volta a se inserir imediatamente no VII, do art. 11 da Lei 8.213/91, ainda que no mesmo ano civil.
Para melhor compreensão, transcrevo a ementa do paradigma (grifo no original):
PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI (PUIL). REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 301. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. LEI 8.213/91, ART. 48, §§ 1º E 2º. COMPATIBILIZAÇÃO DAS EXPRESSÕES “IMEDIATAMENTE ANTERIOR” E “AINDA QUE DE FORMA DESCONTÍNUA”. POSSIBILIDADE DE SOMAR PERÍODOS DE ATIVIDADE RURAL, INDEPEDENTEMENTE DO EXTENSÃO DO INTERVALO ENTRE ELAS. A PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO NOS INTERVALOS ENTRE AS ATIVIDADES RURÍCOLAS DEVE SER DESCONSIDERADA NA ANÁLISE DO DIREITO À APOSENTADORIA RURAL. ENTENDIMENTO ADOTADO PELO INSS. INEXISTÊNCIA DE CONTRARIEDADE AO TEMA 642 DO STJ. ART. 11, § 9º, III DA LEI 8.213/91 NÃO DISCIPLINA A CONTAGEM DO TEMPO RURAL PARA A APOSENTADORIA POR IDADE, MAS, SIM, A CARACTERIZAÇÃO DA CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL. DEFINIÇÃO DOS MOMENTOS DE DESCARACTERIZAÇÃO E RECUPERAÇÃO DA CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL. PUIL PROVIDO COM FIXAÇÃO DE TESE.
1. A aposentadoria por idade do trabalhador rural, prevista no art. 48, §§ 1º e 2º da Lei 8.213/91, será devida aos 60 anos de idade para o homem e aos 55 anos de idade para a mulher, desde que comprovado o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência.
2. Imediatidade não se confunde com continuidade. Ao exigir a comprovação da atividade rural em período imediatamente anterior ao requerimento, a lei indica que a aposentadoria prevista nos § § 1º e 2º, do art. 48 da Lei 8.213/91 é para as pessoas que conservam a condição de trabalhador rural, sendo insuficiente o fato de terem trabalhado no campo em período pretérito. Em palavras diretas: o benefício é para quem “é trabalhador rural” e não para quem “foi trabalhador rural”.
3. Atendido o critério da imediatidade, a exigência dos 180 meses de trabalho rural pode ser preenchida de modo descontínuo, sendo irrelevante para o legislador o tempo decorrido entre os períodos de atividade rural, desde que, no momento do requerimento ou da implementação da idade, o segurado esteja trabalhando no campo. O intervalo entre períodos de atividade rural não afeta a imediatidade, ainda que tenha ocorrido a perda da qualidade de segurado.
4. Não há coerência em utilizar os parâmetros do período de graça na definição de um “tempo rural remoto”, provocado por uma “interrupção” da atividade, capaz de gerar a “perda da vocação” rural. Todos esses critérios são inexistentes na lei e decorrem de uma confusão entre imediatidade e continuidade. Quando autoriza a contagem descontínua do tempo de trabalho rural, a lei garante ao segurado o aproveitamento de todo o tempo trabalhado no campo, mesmo que em momentos diferentes de sua vida laborativa. Isso significa que a descontinuidade não se converte em uma “interrupção” que obsta a contagem do tempo mais antigo: a lei não prevê qualquer exclusão de tempo “remoto”.
5. A opção legislativa está em perfeita harmonia com a política pública constitucional para a previdência social. Seria incoerente, injusto e incompatível com os princípios da vedação à proteção insuficiente e da uniformidade e equivalência da proteção previdenciária das populações urbana e rural permitir que anos de trabalho no campo se transformassem em um nada jurídico.
6. Afirmar que a perda da qualidade de segurado nos intervalos entre as atividades rurícolas deve ser desconsiderada na análise do direito à aposentadoria rural não representa qualquer contrariedade ou divergência ao entendimento do Superior Tribunal de Justiça, fixado no tema 642, cujo objeto se limitou à análise da necessidade de o segurado estar exercendo atividade rural quando completa a idade mínima para a aposentadoria.
7. O INSS, administrativamente, permite a soma de todos os períodos de trabalho rural, independentemente da extensão do intervalo entre eles, mesmo quando ocorre a perda da qualidade de segurado (art. 259, IN Pres INSS 128/2022; art. 267, Portaria DIRBEN/INSS 991/2022 e manifestação da autarquia nos autos).
8. O art. 11, § 9º, III da Lei 8.213/91 não disciplina a contagem do tempo rural para a aposentadoria por idade, mas, sim, a caracterização da condição de segurado especial.
9. A partir do 1º dia do mês seguinte da extrapolação dos 120 dias de atividade remunerada no ano, o segurado deixa de se enquadrar como especial, passando a integrar nova categoria de segurado obrigatório. Cessada a atividade remunerada e comprovado o retorno ao trabalho de segurado especial, o trabalhador volta a se inserir imediatamente no VII, do art. 11 da Lei 8.213/91.
10. Tese:
Cômputo do Tempo de Trabalho Rural
I. Para a aposentadoria por idade do trabalhador rural não será considerada a perda da qualidade de segurado nos intervalos entre as atividades rurícolas.
Descaracterização da condição de segurado especial
II. A condição de segurado especial é descaracterizada a partir do 1º dia do mês seguinte ao da extrapolação dos 120 dias de atividade remunerada no ano civil (Lei 8.213/91, art. 11, § 9º, III).
III. Cessada a atividade remunerada referida no item II e comprovado o retorno ao trabalho de segurado especial, na forma do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, o trabalhador volta a se inserir imediatamente no inciso VII, do art. 11, da Lei 8.213/91, ainda que no mesmo ano civil.
11. PUIL provido.
Ao negar o cômputo do período de 31/01/1981 a 24/11/2000, por considerá-lo tempo rural remoto, o aresto recorrido destoou da posição firmada pela TNU, que expressamente rechaçou a possibilidade de exclusão de cômputo de tempo rural remoto, para fins de concessão de aposentadoria por idade rural, por considerar irrelevante "o tempo decorrido entre os períodos de atividade rural".
Assim, nos termos da Questão de Ordem 38 da TNU, deve ser restabelecida a sentença, que aplicou o entendimento aqui exposto e acolheu em parte o pedido, para:
a) reconhecer o tempo de serviço rural nos períodos de 31/01/1981 a 24/11/2000 e 01/08/2010 a 19/03/2021, em que o autor comprovadamente exerceu atividade em regime de economia familiar e determinar ao INSS a respectiva averbação;
b) determinar ao INSS a concessão ao autor do benefício de aposentadoria por idade rural (NB 199.595.391-9), desde a data do requerimento administrativo, em 19/03/2021;
c) condenar a parte requerida a pagar à parte autora os valores vencidos por requisição de pagamento, com juros de mora e atualização monetária. Os juros serão contados desde a citação (Súmula n. 204 do Superior Tribunal de Justiça) e iguais ao índice de remuneração da caderneta de poupança. A correção monetária incidirá desde a data em que os valores eram devidos, segundo o INPC. Por força do art. 3º da EC 113/2021, a contar de 09/12/2021, a aplicação da SELIC, uma única vez, englobará correção monetária e juros moratórios [grifo no original].
Com base no art. 55, caput, da Lei 9.099/1995 e na QO 2/TNU, condeno o réu, agora vencido em seu recurso inominado, ao pagamento de custas e honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação.
Registro que esta situação não se confunde com a majoração da verba honorária prevista no art. 85, § 11, do CPC, inaplicável ao sistema recursal dos Juizados Especiais Federais, segundo a Questão de Ordem 41 da TNU:
O §11, do art. 85 do Código de Processo Civil, que determina a majoração de honorários no julgamento de recursos, não se aplica no sistema recursal dos Juizados Especiais Federais.
Ante o exposto, voto por: (i) DAR PROVIMENTO ao pedido de uniformização interposto pela parte autora, para restabelecer a sentença desconstituída pela Turma Recursal de origem; e (ii) CONDENAR a parte ré ao pagamento de custas e honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação.
Documento eletrônico assinado por JOÃO CARLOS CABRELON DE OLIVEIRA, Juiz Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://eproctnu.cjf.jus.br/eproc/externo_controlador.php?acao=consulta_autenticidade_documentos, mediante o preenchimento do código verificador 900000293732v11 e do código CRC ea21536d.
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